Enquanto sociedade, precisamos entender que a pandemia do novo coronavírus faz parte de um padrão de escolhas que nós estamos fazendo. Quanto mais expandimos o modelo econômico atual – extremamente predatório — maiores são as pressões em cima dos nossos recursos naturais, acelerando a degradação ambiental.
As doenças zoonóticas (que passam de animais para humanos) como a SARS, MERS, gripe suína e aviária, COVID-19, estão TODAS relacionadas à perda do habitat natural de diversas espécies.
Fomos forçados a parar. E agora? Como seguir?
Não queremos viver no eterno da conexão virtual e do distanciamento. Precisamos buscar a conjunção, através de novas formas de existir para além do ciclo trabalho-dinheiro-consumo, em benefício do bem estar coletivo. E o caminho é a construção do comum, ao apoio mútuo e a solidariedade.
Precisamos fortalecer um novo jeito de empreender, nos distanciando dos padrões atuais do sistema. A pauta do desenvolvimento sustentável precisa estar cada vez mais presente nas discussões.
Temos visto apostas em cenários futuros completamente digitalizados, solitários e online. Nosso posicionamento para o amanhã não é buscar o “conforto” em soluções arquitetônicas tecnomaníacas ou paliativas.
Devemos atuar no centro da questão, e nós, como arquitetas, precisamos nos comprometer com uma agenda sustentável a partir de múltiplas perspectivas: ambiental, social e operacional. Precisamos pensar globalmente, compartilhando conhecimento, e agir localmente, procurando soluções acessíveis e pensadas para cada realidade.
Uma das nossas apostas para a retomada de uma economia mais saudável é o sistema de financiamento coletivo – o crowdfunding. Como o modelo de consumo está mudando e o comportamento do consumidor está sendo direcionado pelo propósito das empresas, acreditamos que ações como estas serão cada vez mais presentes.
Nosso escritório está ajudando uma iniciativa nesse formato (que será lançada em breve), para a construção de um café-loja junto à cozinha de produção para a ZION, que é fruto da parceria entre Thalita e Juliano — a dupla produz, vende e entrega açaí e manteigas de amendoim artesanais. O foco do projeto é sustentabilidade: entregas de bicicleta, ingredientes agroecológicos e orgânicos, produção artesanal, separação de resíduos e reaproveitamento de alimentos para compostagem.
O acesso ao alimento é parte fundamental no desenvolvimento de uma sociedade mais justa e nós acreditamos que a arquitetura deve ser um agente de consolidação da segurança alimentar.
O terreno está localizado na estrada do Pontal, no Recreio dos Bandeirantes, próximo ao Museu Casa do Pontal, que contém o maior acervo de arte popular do Brasil, e às praias mais “selvagens” da cidade como Prainha, Grumari e Reserva. O local ainda guarda ares de interior – por lá vemos charretes, mercearias e pequenos produtores com barracas na beira da rua.
O projeto parte de uma estrutura existente (erguida pela própria dupla) em blocos de concreto, delimitando o espaço construído. Ao redor dela, dispusemos o piso em placas de pallets para nivelar o terreno e a cobertura em pergolado feita de bambu com lona para garantir o conforto térmico.
Treliças, janelas e portas são confeccionadas a partir de materiais reutilizados. A simplicidade se apresenta também nos revestimentos, como o piso em cimento queimado, tintas e verniz ecológicos, sem nenhum acabamento fino. A área externa, emoldurada pelas árvores existentes, dispõe de um espaço expositor para os pequenos produtores locais de insumos que são usados no café — como a banana, o coco, além de verduras e legumes. Mobiliário despojado, redes e um chuveirão ao ar livre completam a atmosfera praiana, tropical e rústica do local.
Ilustração: Giovanna Scalfone